Reinventa-me tu. Dou-te pincéis e tintas de todas as cores, uma tela em branco e, mais do que tudo isso, a imensa liberdade de me recriares à tua medida. Redesenha-me: dá-me olhos menos inquietos, mãos menos aventureiras, braços que embalem tudo menos sonhos. Dá-me pernas imóveis, que não acabem em pés andarilhos. Pinta-me o corpo de um tom de mármore belo e pálido como o das estátuas antigas, em que todo o ardor se transformou já em História. Não te detenhas nos cabelos, deixa-os inacabados. Podem ganhar vida própria e enlear-te como algas, e tu sabes como é perigosa a maresia. Evita a curva do pescoço, e foge dos pormenores no peito e no ventre. Passa a correr pela boca, aí todo o cuidado é pouco. Um último aviso: não me pintes um coração nem um cérebro. Porque, se o fizeres, eu volto a construir-me como era. (Imagem - René Magritte, "Tentando o Impossível")
quarta-feira, 2 de abril de 2008
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20 comments:
Querida Ana,
um texto cheio de força que toca assunto muitas veses síntese da incompreensão nas relações entre os dois sexos. A Mulher tende, maioritariamente, a receber bem as pequenas moldagens do Homem que ama, vendo nisso uma prova do interesse que desperta. Mas, em compensação, procura modificá-lo numa multitude de pequenas coisas, por vezes sem razão premente, como que necessitando de avaliar o grau de correspondência por essa parte irrisória do seu império. E o pior é que a maior parte dos homens não tarda a cansar-se dessa coerência no esforço e a tomá-la como insulto...
Por muito que a Sociedade mude estas tendências mantêm-se.
Todo o cuidado é pouco na boca? Ai, concordo, ai se concordo.
Beijos
sem palavras eu ..
(Adorei)
Beijinho
Tchi! Não precisas escrever mais nada durante uns dias, Ana!...Deixa-nos gozar este texto, por favor, pelo menos uns 2 dias. Deixa-o estar aí quietinho.
É Primavera!
vou linkar!
Perfeito, Ana - imagina�o e ironia s�o irresist�veis quando se d�o as m�os.
Beijo pra voc�
Que lindo Ana. Obrigada!
Para pôr "vezes" onde está "veses", esta digitação, ai ai.
Beijo
Obrigada a todos. Não pensei que esta simples divagação, inspirada pelo meu queridíssimo Magritte (cuja imaginação vai MUITO além da minha) colhesse tanto agrado. Mas ainda bem, fico contente.
Paulo, quanta sabedoria sobre o universo feminino! É isso mesmo... nós temos sempre essa ilusão de que é possível modificar os homens que amamos, de acordo com a imagem que idealizámos deles. Por isso nos deixamos moldar também. Mas tudo isso é uma ficção: ninguém muda alguém que não queira mudar.
Quanto a comentários femininos, nem são precisos. Acho que todas me entenderam muito bem.
Beijos
uau! e agora? adiantaste-te a um post que ando para fazer há uns 15 dias sobre um outro trabalho do magritte, mas não há meio de me sair... assim já nem sei...
Entendemos, claro. Mas mesmo que não entendêssemos, era só para dizer que adorei!
Beijo
Bonito. E mais não digo porque já foi tudo dito.
Beijos
Já tudo foi dito. Nada tenho para dizer mas mesmo assim quero e digo: Adorei!
Bonito texto. Dizem muitos Padres - e sabemos como eles sabem bem do que falam - que o problema da relação a dois é um querer mudar o outro. É um exercício engraçado e que nos faz crescer, esse de respeitar a individualidade daquele com quem partilhamos a vida. E aprender a gostar dele, tal como ele é.
Nesse sentido o texto - belo, repito - faz tantos avisos à navegação que a minha primeira tentação foi fugir. Voltei...porque afinal é só literatura. :)
Lindo...!
Completo, repleto, transbordante, pincelado, com cores, toneladas de doce.
Tens um jeito próprio para nos fazeres saltar a linha do imaginável.
Adorei!
Bj
JP
Miúda, estavas muito inspirada! É belíssimo o que escreveste e muito plástico também.
Parabéns, está mesmo bonito. Simples, mas com muito 'movimento de pulsos', se assim lhe posso chamar. É ondeado o movimento, o prazer do caminho percorrido num corpo, lembras-te?
E sabes uma coisa? É muito teu este texto, daqueles que, se eu lesse sem saber, poderia dizer: isto faz-me lembrar a Ana a escrever. Toma isto como um elogio, claro está!
beijos e mais beijos
Oh, Miguel, se eu não soubesse que me estavas a provocar, perguntaria agora: "Padres, Miguel?? A que propósito?". Mas já aprendi a ler-te as ironias difusas, embora ache sempre graça a responder-te.
Este texto é sexuado de mais para invocarmos o conhecimento de membros do clero sobre o assunto, embora todos saibamos que eles também são de carne e osso (a Igreja esqueceu-se de castrá-los, para melhores resultados práticos...) e por isso muitas vezes esse conhecimento vai além da teoria, também neles. É humano.
Mas já começa a parecer-me que essa tua obsessão em misturar religião e sexo está a transformar-se num fétiche!
;)
Beijinho
TCL, coincidências? Nem tanto, porque eu sei que também gostas do Magritte. Faz o teu post, estou morta por ver.
Mariav, Pitucha e Estrelicia, obrigada a todas.
Pedro, obrigada também. E para fazer passar a barreira do real, não há como os teus textos!
Sofs, para ti um obrigada especial. Gosto sempre dos teus comentários críticos, até porque sei como o teu crivo é bem apertado! E gostei sobretudo do "movimento de pulsos", uma bela imagem que ultrapassa o meu texto.
Beijinhos
Uma simples divagação, inspirada pelo magnífico Magritte mas materializada em escrita de uma forma superior. Parabéns cara AV.
Mike, seja muito bem-vindo. Obrigada pelas palavras simpáticas.
Lindo texto, parabéns! Achei belíssimo e retrata a essência humana.
O meu link é www.maluxure.blogspot.com, caso queira me visitar.
Abraços, Cherrie.
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