A calma é daquelas coisas que só a vida e o tempo nos ensinam. E, mesmo assim, podemos viver uma vida inteira sem aprendê-la: não adianta lê-la nos olhos dos outros, ouvi-la da boca dos outros, percebê-la nos gestos e atitudes dos outros. A calma é muito mais fácil de aconselhar do que de praticar, mesmo para quem já passou por muitas tempestades e lhes sobreviveu.
E no entanto é um conceito linear, talvez o mais simples dos segredos: saber esperar. Esperar o tempo exacto para colher os frutos no momento certo, ganhando o prémio de não saboreá-los verdes e, por isso mesmo, ainda insípidos; respirar fundo e deixar passar a onda, para poder vir à superfície em seguida, não só ainda vivo como capaz de mais umas braçadas até à praia; deixar que alguma distância se interponha entre nós e a nossa voracidade espontânea, para que aquilo que queremos muito nos seja dado com prazer e não entregue por assalto à mão armada. Porque tudo o que se conquista lentamente tem o dobro do sabor e da duração.
A calma é um bem precioso, mas escasso. Nele radicam, tão só, a justiça e a sabedoria. E ao contrário da fama que tem, completamente errada, a calma não impede ninguém de viver plenamente e com emoção. Muito pelo contrário, aliás. Difícil, mesmo, é entendermos isto. Somos viciados em emoções fortes, em adrenalinas fáceis e momentâneas. Temos pressa, e por isso atropelamos sensações e queimamos etapas, tudo para chegar mais cedo. E com isso perdemos, quase sempre, o prazer indizível da viagem.
(Tocando em frente - Maria Bethânia)
Nota: esta canção de Almir Sater (a prova de que até dos "pirosos" podem sair criações magníficas), muito valorizada também pela voz inconfundível de Maria Bethânia, diz-nos tudo o que é preciso saber:
Nota: esta canção de Almir Sater (a prova de que até dos "pirosos" podem sair criações magníficas), muito valorizada também pela voz inconfundível de Maria Bethânia, diz-nos tudo o que é preciso saber:
Ando devagar porque já tive pressa, e levo esse sorriso porque já chorei demais. Hoje me sinto mais forte, mais feliz, quem sabe, só levo a certeza de que muito pouco eu sei, eu nada sei...
Penso que cumprir a vida seja simplesmente compreender a marcha e ir tocando em frente. Como um velho boiadeiro levando a boiada, eu vou tocando os dias pela longa estrada, eu vou, estrada eu sou...
Todo mundo ama um dia, todo mundo chora, um dia a gente chega, no outro vai embora. Cada um de nós compõe a sua história, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz, de ser feliz.
Conhecer as manhas e as manhãs, o sabor das massas e das maçãs...
É preciso amor para poder pulsar, é preciso paz para poder sorrir, é preciso chuva para florir."
9 comments:
Muito difícil, sim Ana, apesar de sempre ter tentado nunca saltar etapas, de vez em quando....
Um Bom Natal, na Casa de Família.
Beijinho
Fantástica entrada, Ana. E venham mais piroseiras destas porque são bem vindas!
Obrigada a ambos e Bom Natal, cheio de calma no sapatinho...
LOL... adorei esta!!! Era para mim ou hoje deu-te para pensares na calma? Veio mesmo a calhar e vou ver se a tenho... Devagar mas com confiança...
Adoro Bethânia!
Um beijinho miúda
Não, esta era mesmo para mim.
Pode ser que de tanto repetir a teoria eu consiga passar à prática...
Também amo a Bethânia.
Excelente definição, Ana! Tomei a liberdade de copiar e levar para a minha redação, para reler sempre, pois temos memória fraca, não é?
Beijo!
Faça isso, Bill. E aqui tem uma sertaneja, daquelas que você gosta! (desta, até a Bethânia, não é?)
Já lá fui espreitar o seu Jornal da Lua, é bem divertido.
Bom Natal para vc.
Levei a calma comigo. Só não levei a música. Vou mandar o meu pessoal para que ouçam a Bethânia. Obrigado.
Ana,
Encontrei a tua calma no Zoo, deixei lá um comentário, mas não podia deixar de te congratular "pessoalmente" pela excelente e calma reflexão!
Excelente!
Beijinhos serenos***
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