sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Riscos na coronha


Do terrível naufrágio de um paquete de luxo, salvam-se apenas uma passageira VIP - Claudia Shiffer (por exemplo, mas aqui cada um pode pôr o nome que mais lhe agradar) e um português, membro da tripulação. Conseguem nadar até uma minúscula ilha deserta e levar com eles alguns objectos, com que ele faz uma tenda rudimentar. A princípio o relacionamento entre eles é praticamente nulo e mudo, ela mantendo a pose de estrela e ele a deferência a que estaria obrigado em circunstâncias normais: pesca e cozinha para ela, dorme à porta da tenda para guardá-la durante a noite, acende fogo para ela se aquecer, enfim, cumpre as tarefas básicas, mantendo as distâncias. Mas, com o tempo, a necessidade e a falta de alternativas, a relação começa a estreitar-se e acaba num previsível e tórrido romance entre os dois. Passam a partilhar a tenda e a dividir as tarefas e o idílio dura uns tempos, na maior felicidade. Até que ele começa a entristecer, sem razão aparente. Anda cabisbaixo, embora esteja grato aos caprichos do destino por lhe terem posto no caminho aquela mulher de sonho. Ela, preocupada, pergunta-lhe o que pode fazer para animá-lo:

- Falta-te alguma coisa? Não te faço feliz?

- Claro que sim, meu amor. Não posso ser mais feliz! Mas é que... - e cala-se.

- Diz, diz! Faço tudo o que quiseres para te ver feliz...

- Não sei se me vais levar a mal...

- Claro que não, querido. Diz lá.

Depois de grandes hesitações, ela lá consegue convencê-lo a dizer o que quer. E ele pede-lhe então, ainda a medo:

- Importas-te de vestir a minha roupa, pintar um bigode e pôr um chapéu, como se fosses um homem?

- ???

- Não me faças perguntas. Entras na tenda assim e não dizes nada. Fazes isso por mim?

Estranhando, mas disposta a satisfazer o que pensa ser uma fantasia dele, talvez por causa da rotina sufocante daquela ilha, ela acede. E, mal entra na tenda vestida de homem, ele abre um sorriso radioso como há muito tempo não lhe via:

- Manel !!!!!

- ???

- É pá, sabes quem é que eu ando a comer agora, sabes??? A Claudia Shiffer!!!!!

Notas à margem: Esta velha história, que tem graça, retrata bem os homens numa das suas piores facetas. Ou talvez só (para não cair em generalizações injustas) aquele tipo de homens para quem as conquistas - ou qualquer coisa que interpretem como tal - não valem nada sem o conhecimento dos outros. São os que fazem os chamados "riscos na coronha", uma exibição de plumagens só admissível na adolescência e que para nós, mulheres, demonstra invariavelmente um comportamento infantil. Para não dizer pior, porque essa imaturidade gritante é de uma deselegância a toda a prova. Fica-lhes muito mal. Além disso, quantas vezes o segredo de uma história a dois não é o seu maior atractivo? E quantas vezes a atracção não se desfaz com esse exibicionismo escusado, porque nunca tinha passado disso mesmo: uma atracção, ou o picante que tem sempre um segredo?...

15 comments:

Anónimo disse...

Sensibilidade masculina

"Um homem estava em coma, há já algum tempo. A mulher estava à sua cabeceira, dia e noite. Um dia, o homem acorda, faz sinal à mulher para se aproximar e sussurra-lhe:
- Durante todos estes anos estiveste ao meu lado. Quando me licenciei, estavas comigo. Quando a minha empresa faliu, estavas lá a apoiar-me. Quando perdemos a casa, ficaste perto de mim. Quando perdemos o carro, também estavas comigo. E quando fiquei com todos estes problemas de saúde, acompanhaste-me sempre. Sabes que mais?
Os olhos da mulher encheram-se de lágrimas:
- Diz, amor.
- Acho que me dás azar!"

ana v. disse...

LOL!
Essa tem graça, Margarida. Não vou dissecar a história nem procurar-lhe os significados ocultos, porque perderia todo o nonsense e a piada que tem. E a verdade, verdadinha, é que existem mesmo mulheres assim: muito solícitas, mas... que atraem o azar. Não, certamente, nenhuma de nós duas, Margarida!

Um beijo
ana

Anónimo disse...

Muito básico, Ana.
Demasiado generalista e fácil.
De esteoreotipio em estereotipo, afastamo-nos da verdade factual.
Consegues melhor.

Anónimo disse...

Provavelmente, se eles fazem apenas riscos na coronha, elas sabem os nomes e moradas, os centímetros e a cor dos olhos...

ana v. disse...

Pois é, Mário, elas são mesmo mais observadoras. Logo, menos básicas...
A história é simples, sim. Como os provérbios, que condensam o essencial.

ana v. disse...

E qual é a verdade factual, já agora? É só por curiosidade, para eu conseguir melhor, para a próxima...

Anónimo disse...

A história vale o que vale.
É história, é anedota, mas traduz alguma realidade.
Mas exorbitemos desta relação homem /mulher ou mulher/homem para não criar melindres.
Se olharmos em redor, o faz de conta da vida gira inexoravelmente em torno do "poder contar".
E não é um poder contar de salutar partilha é a jactância e ostentação que conferem a verdadeira realidade às coisas.
Fora delas o prazer da fruição é incompleto a e a integração interior ausente.
As "conquistas" femininas ou masculinas não fogem à regra.
Sou homem e sei partilhar com dignidade e sem preconceito.
Porque não?
Se calhar o problema existe só quando falam de meras conquistas como no dia em que compram o Cayenne S para ir em Julho para o algarve.
Por isso, também com as mulheres, têm de contar à malta se era uma versão full extras.
Quando nos encaminhamos para um estádio em que não precisamos de provar nada aos outros o filme é diferente.
São outros trocados.
E felizmente ainda vai havendo alguns que conseguem lá chegar.
Com as mulheres e com a vida em geral, não necessáriamente "contando", mas crescendo em cada dia que passa.
Longa conversa bem mais ampla que a guerra dos sexos!!!!!

ana v. disse...

Anónimo,

Muito mais ampla, sim, sem dúvida.
Mas, já agora, gostava que me explicasse a sua frase: "Sou homem e sei partilhar com dignidade e sem preconceito. Porque não?"
É que não percebi. Partilhar o quê, e com quem?

Anónimo disse...

Partilhar com os outros mesmo o que às relações com as mulheres diz respeito.
O bom, o mau,as alegrias e tristezas.
Tudo o que na vida pode e deve ser partilhado.
Mas não propriamente á laia de troféu de caça.
Isso já não se usa!

ana v. disse...

Não se usa? Acha mesmo? Não devia usar-se, não, mas ainda há muito disso por aí. Infelizmente, a exibição do "troféu" é muito comum e serve até de arma de arremesso, quando as coisas não correm bem.
E é a isso que se refere esta anedota, não à partilha saudável e consentida. Essa é normal, mas há que consultar os visados primeiro, ainda assim. Ou então é inconfidência e deselegância, não acha?

Anónimo disse...

Eu sei bem que ainda há quem use!
E sei bei que de tão enraizada, o lutar contra esta corrente não é tarefa fácil, muito pelo contrário.
Já passei muitas horas em saudáveis tertúlias onde defender certos pontos de vista significa, aos olhos de muitos, pura e simplesmente mentir.
A rapaziada não admite, não acha normal.
Não é possível pensar diferente.
Felizmente que não são todos.
E se quer que lhe diga e passe a ferroada até são ainda muitas as mulheres que preferem à moda antiga.
Se calhar preferem o mau que dominam a um bom que não conhecem.
Vá lá a gente entender!
Claro que a anedota não se refere à partilha saudável.
A minha vinda a terreiro só quis no fundo dizer que ainda vai havendo uns que não são como o da anedota, por natureza, por aprendizagem ou pelas duas coisas.
No que se refere ao consentimento, distingo partilha e devassa.
Cabe aos partilhantes acautelar a justa definição das fronteiras. Tenho para mim que as mentes sadias são capazes de dar conta desse recado, sem mácula da descrição ou da elegância.
Isto porque os pressupostos da partilha são outros e aí reside toda a diferença.

ana v. disse...

É isso mesmo. Agora é que você disse tudo, caro anónimo.
Tudo está na diferença fundamental entre essas duas palavras: partilha e devassa, com tudo o que implicam as intenções que estão por detrás de uma e de outra. Cabe aos espíritos saudáveis e bem intencionados distinguir as duas, e saber quando estão a partilhar ou a devassar, e com que objectivo.

Anónimo disse...

Está a ver que para bem do BEM ELES não são mesmo todos iguais!!!

ana v. disse...

Claro que não são todos iguais. Para BEM DELES, mas, sobretudo, para NOSSO BEM!
Mas eu nunca disse que eram todos iguais. Se voltar a ler o que eu escrevi no meu texto, vai encontrar isto:
..."Ou talvez só (para não cair em generalizações injustas) aquele tipo de homens para quem as conquistas - ou qualquer coisa que interpretem como tal - não valem nada sem o conhecimento dos outros."
Como vê, não misturo tudo no mesmo saco. Há homens seguros do que são e do que valem, sem necessidade de exibirem as suas conquistas como troféus para se auto-promoverem ou para atingirem alguém.
Gostei deste debate, anónimo.

Anónimo disse...

...e eu também!