sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Bicicletas II

Na minha bicicleta de recados
eu vou pelos caminhos.
Pedalo nas palavras atravesso as cidades
bato às portas das casas e vêm homens espantados
ouvir o meu recado ouvir a minha canção.
Na minha bicicleta de recados
eu vou pelos caminhos.
Vem gente para a rua a ver a novidade
como se fosse a chegada do João que foi à Índia
e era o moço mais galante que havia nas redondezas.
Eu não sou o João que foi à Índia
mas trago todos os soldados que partiram
e as cartas que não escreveram
e as saudades que tiveram
na minha bicicleta de recados
atravessando a madrugada dos poemas.
Desde o Minho ao Algarve
eu vou pelos caminhos.
E vêm homens perguntar se houve milagre
perguntam pela chuva que já tarda
perguntam pelos filhos que foram à guerra
perguntam pelo sol perguntam pela vida
e vêm homens espantados às janelas
ouvir o meu recado ouvir a minha canção.
Porque eu trago notícias de todos os filhos
eu trago a chuva e o sol e a promessa dos trigos
e um cesto carregado de vindima
eu trago a vida na minha bicicleta de recados
atravessando a madrugada dos poemas.
(Manuel Alegre)
Nota: Est post foi modificado. Os Queen e a sua Bicycle Race ficam para a próxima. Il Postino, de Ennio Morricone, vem mais a propósito para este belo poema, oferecido pelo meu amigo MC.

9 comments:

Ricardo António Alves disse...

Perfeito para prosseguir as férias, vizinha, de preferência na ciclovia!

ana v. disse...

É verdade, mas prefiro o paredão. E a pé, por muito que goste de bicicletas!

Anónimo disse...

Abraços, Ana. E boas pedaladas pelos caminhos da utopia.
Mário


Na minha bicicleta de recados
eu vou pelos caminhos.
Pedalo nas palavras atravesso as cidades
bato às portas das casas e vêm homens espantados
ouvir o meu recado ouvir minha canção.

Na minha bicicleta de recados
eu vou pelos caminhos.
Vem gente para a rua a ver a novidade
como se fosse a chegada
do João que foi à Índia
e era o moço mais galante
que havia nas redondezas.
Eu não sou o João que foi à Índia
mas trago todos os soldados que partiram
e as cartas que não escreveram
e as saudades que tiveram
na minha bicicleta de recados
atravessando a madrugada dos poemas.

Desde o Minho ao Algarve
eu vou pelos caminhos.
E vêm homens perguntar se houve milagre
perguntam pela chuva que já tarda
perguntam pelos filhos que foram à guerra
perguntam pelo sol perguntam pela vida
e vêm homens espantados às janelas
ouvir o meu recado ouvir minha canção.

Porque eu trago notícias de todos os filhos
eu trago a chuva e o sol e a promessa dos trigos
e um cesto carregado de vindima
eu trago a vida
na minha bicicleta de recados
atravessando a madrugada dos poemas.

Manuel Alegre

ana v. disse...

Olá, Mário.

Sei que sabes, tão bem como eu e o Manuel Alegre, que é pedalando pelos caminhos da utopia que se atravessa a madrugada dos poemas. E este poema é lindo.

Gostei do que trouxeste na tua bicicleta dos recados. E quando o João for à Índia, não te esqueças de dar notícias.

Um beijo

Anónimo disse...

O poema é, de facto, lindo - e há sempre Índias à espera dos Joões.
Por acaso, o assunto bicicleta está a despertar-me enorme interesse, porque o que o MA aqui descreve tem algo de "Postino de Pablo Neruda" e de um ritmo humano e aldeão de sentir o mundo.
Vou tentar descobrir mais coisas...
Beijinhos e bom fim de semana.
Se estiver muito calor, venho aqui apanhar um bocadinho de vento.

ana v. disse...

Tem graça, quando li o poema lembrei-me logo do carteiro do Neruda. Tem a mesma ingenuidade e a mesma simplicidade que davam ao filme toda a graça. Haja almas assim, é do que estamos todos a precisar.
(Vou passar o poema para este post da bicicleta. Se encontratres mais textos, manda sempre).
Beijos

ana v. disse...

Já lá está. E lembrei-me agora duma coincidência engraçada: o carteiro chamava-se Mario, também.

Pedro F. Sanchez disse...

E já somos 3, e certamente não seremos os únicos, cujos pensamentos são desviados para o carteiro de Neruda. Talvez mesmo o MA tenha ido aí beber.

bjs, pp.

ana v. disse...

Olá, PP, que surpresa!
Sejas muito bem vindo a esta casa. E tiveste um baptismo de luxo, com poesia e música. Volta sempre.