quinta-feira, 6 de março de 2008

Observatório IV





Vá ao Brasil... cá dentro

É do conhecimento geral a insegurança que se sente em terras de Vera Cruz (que não conheço e, sinceramente, não me desperta assim muita curiosidade), com relatos de assaltos à mão armada a tranquilos e incautos transeuntes, cenas de tiroteio com mortes à séria em favelas problemáticas, raptos de pseudo celebridades ou de familiares seus, enfim, opções várias a contrastar com as belezas de postal ilustrado, tanto as naturais como a das nativas, que enchem os sonhos de todo o potencial viajante. Ir ao Brasil é quase obrigatório.

No centro da origem desta insegurança, com cenas de autêntico filme de terror, está sentado o enorme desequilíbrio da distribuição da riqueza, numa pirâmide desproporcionada, de base anormalmente alargada para um cume demasiado estreito, onde tão poucos têm tanto para tantos que têm tão pouco, criando problemas sociais de difícil solução. Resta, por isso, a violência, aos desfavorecidos.
O fenómeno da violência, recente neste nosso cantinho pasmacento, tem vindo a instalar uma insegurança latente, qual amiba que vai conquistando, lentamente, o seu terreno. Não falo de roubos por esticão, nem de assaltos a pessoas e casas, que isso já fazia parte do nosso património. Mas hoje em dia já temos carros armadilhados a explodir em plena cidade, assassinatos à porta de casa, gangs a (do)minarem os negócios da noite, com cenas de faca e alguidar e mortos e feridos pelo meio.

Apesar de haver também desequilíbrios sociais, como em qualquer parte do mundo chamado civilizado, com ricos muito ricos e pobres muito pobres, não estamos, nem de longe, sentados em cima de nenhum barril de pólvora, prestes a rebentar numa convulsão social grave. Claro que temos as nossas socr(ch)atices do dia à dia, mas que não explicam esta violência tão violenta que nos tem assaltado ultimamente.

Acredito mais que as guerrazinhas intestinas por poderes entre as nossas polícias e orgãos judiciais, com os protagonistas a porem-se em biquinhos de pés para serem vistos, as desinteligências nos serviços de inteligência, com a consequente viscosidade numa informação que não se troca nem circula, a acrescer ao nosso tradicional laxismo, são os principais factores que abrem porta à proliferação desta marginalidade, de consequências tantas vezes fatais.

Telenovelas, já tínhamos. Sol e praia, também. Chopinho, qualquer cervejinha nacional dá bem conta do recado. Bumbuns escaldantes... bom!... também temos. Fio dental... hum... sim, sim, também. Até o Carnaval de Torres e de Loulé (sem desprimor para tantos e tantos outros, que Portugal é um carnaval pegado) se vão medindo já com os do Brasil (sem desprimor também, claro). E, ouvir falar brasileiro, naquele tom morno e cantado... qualquer fast food nos serve ao balcão. E futebol, também, que baste...

Até temos um Cristo Rei e, agora, esta insegurança geral. Já não preciso de ir ao Brasil. Basta-me pôr o pé fora de casa...

Pedro Silveira Botelho

13 comments:

miguel disse...

A questão a pôr, no meu ponto de vista é : será a onda de violência, estrutural? Veio para ficar? É significativa? É uma onda, ou uma sucessão mais ou menos alietória? Uma coisa estou certo: se eu fosse director de jornal recusava-me a pôr a foto na primeira página
da mulher morta em Sacavém e ainda por cima sugerindo um homicídio premeditado.a comunicação social anda a reboque do voyeurismo do pessoal. Recuso-me a entrar nessa onda e por isso sou cauteloso e prefiro esperar por aquilo que a

miguel disse...

...polícia conclua ( falhei o final do comentário anterior)

abraçoo Pedro

ana v. disse...

Miguel,
Concordo contigo em que não devemos entrar em histeria colectiva, mas parece que já se provou a ligação deste caso com, pelo menos, um outro. O que sugere crime organizado, e não uma concentração de violência casual. Não podemos ter a ilusão de que vamos continuar eternamente em estado de graça neste assunto, ao contrário do resto do mundo. Infelizmente.
Beijo

Mad disse...

O que eu acho é que importámos a falta do respeito pela vida humana que existia no crime português. Sempre houve assaltos e crimes mas raramente se via um assassínio a frio como os que se viram nos últimos dias. E isso, meus amigos - e pondo de parte qualquer fobia que eu tenha àcerca de brasileiros - foi importado do Brasil, quer gostem de ouvir quer não.

Não quero dizer com isto que esta falta de respeito pela vida não seja exclusiva do Brasil, muito pelo contrário: é típica de toda a América do Sul. Mas nós, sem sombra de dúvida, importámo-la do Brasil. Ou têm dúvidas?

ana v. disse...

Não concordo. Acho que não foi só do Brasil, seguramente. Os crimes "a sangue frio" têm muitas vezes a assinatura de máfias, e essas vêm do leste. É verdade que o nosso crime era mais passional e que isso está a mudar, mas esse é o preço da globalização. E nós fazemos parte do mundo dito "civilizado" da União Europeia, ainda que os nossos salários digam o contrário...

PSB disse...

Miguel
Acho legítimo haver comunicação social que dê de comer ao voyeurismo pacóvio que nos caracteriza. Tendo, óbviamente, responsabilidades na forma como nos informa, tê-lo-á menos na forma como nos forma. Mas não podemos perder de vista que são um negócio que visa o lucro, dependente das tiragens e, portanto, das notícias com que atraem os compradores. Será por isso que os pasquins se vendem como pipocas. Mais uma vez, a 'culpa' é da nossa (in)cultura que alimenta, comprando, o sensacionalismo.
Por outro lado, parece-me, concordando com a Ana, que as situações desta violência recente, têm a ver com as máfias instaladas, fruto de inoperacionalidades policiais, umas vezes, porventura, coniventes, outras inoperantes (a ideia que tenho é que trabalham de costas voltadas uns para os outros, cada um no seu quintalinho) e da impunidade judicial, criada quer pela morosidade quer, também, pela inoperância. Que há falta de polícias na rua, é um facto. Não os vemos. Que medidas avulsas como a de contratar, à pressa, mais 2000 polícias, evitem este tipo de crimes, não acredito.
E Mad, lamento também não concordar com a responsabilidade que atribuis ao Brasil. A comparação foi meramente graciosa, porque acho, mesmo, ser mais consequência da quebra das barreiras alfandegárias intracomunitárias e a livre circulação de pessoas sem controlos. Quando damos por eles, já cá estiveram, já não estão e já fizeram a me.da a que se propunham.
Beijos e abraços para todos

Anónimo disse...

A insegurança nacional é uma consequência da abertura de fronteiras, um sinal dos novos tempos que atravessamos. Tudo tem um preço, estou com a Ana. Este é um tema actualíssimo, infelizmente, e esperemos que esta onda de crimes não vá alastrar ainda mais e transformar-se no tsunami que aflige já tantos outros países.
Um abraço

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

é uma dor de alma, Ana...

perdemos a identidade aos poucos. No Carnaval vemos essas fantochados em pleno Inverno,faça frio,faça sol, em bikini.
A Caipinha já terá mais saida do que um bom Porto,uma ginginha, ou uma boa aguardente de Amarante.

Não deveria interessar-nos de Onde vem essa gente mas Quem vem. A qualidade dos imigrantes ,deveria ser selectiva.

Ao ser atendida por estrangeiros numa esplanada, questiono-me se não haverá desempregados em Portugal...

Entretanto, quando estive no Nordeste Brasileiro, senti-me mais segura do que me sinto no Porto.

bjinho

ana v. disse...

Júlia, é verdade que estamos invadidos por estrangeiros, mas não acho isso necessariamente mau. Muitos deles fazem trabalhos que os portugueses recusam, porque preferem receber o subsídio de desemprego e fazer só uns biscates que não o ponham em causa. Só fora de Portugal fazemos qualquer trabalho, aí não somos esquisitos porque o vizinho não está a ver. É triste, mas é assim.
Quanto à substituição dos nossos hábitos alimentares (e outros), dou-te razão. Mas os portugueses sempre tiveram dificuldade em valorizar o que é deles, infelizmente.
beijinho

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

eu acho mau quando é pior do que o que é nosso, Ana. Quando é melhor, calo-me. Em relação à musica brasileira, por exemplo, eu adiro, eles têm a musica na alma.

Em relação a outras oisas, deveria dar-se primazia ao que é nosso.

Isto sem querer ofender quem é brasileiro, pois gosto das gentes e da sua filosofia.
Digo que há brasieiros e há brasileiros . Há gente de Leste boa e há má. Repito: não interessa de onde venha, interessa quem vem.

beijinho

Sofia K. disse...

Mais uma vez gostei do texto do PSB!
Mas acho que a violência a que temos assistido não é importada, mas é fruto do estado de país, não só de miséria (infelizmente é esta a palavra), mas também de insegurança, por falta de polícia, de meios, de métodos e de coordenação... (E depois vamos à Baixa e os senhores policias passeiam-se de Segway!).

Estávamos mais habituados às mortes entre vizinhos, entre familiares, aquelas historietas de pasquim... Agora estas histórias dos assaltos nos sinais de trânsito, no estacionamento à porta de casa, no café da vila, no shopping onde vamos sempre (Ana os nossos cafés no Oeiras parque!), isso assusta-nos mais... é o perigo à porta de casa, quando ele parecia estar na terriola longínqua, nas séries de televisão, ou num país distante... Mas agora é nos nossos lugares-comuns e isso dá medo...

beijos

ana v. disse...

É isso, Júlia: há bom e mau em todo o lado. Se pudéssemos escolher quem entra...

Sofia, dá medo, sim. Tenho saudades do tempo em que podia andavr sozinha à noite em Lisboa, sem ter que olhar à volta ou estar com atenção aos desconhecidos. Tudo isso acabou.

Anónimo disse...

Pedro, boa tarde...

Conheça o Brasil! Não só as capitais... Não só o que vendem os folders de turismo. Conheça o Brasil! Depois me fala de suas impressões...

Maria.